“Em dia com a Psicologia”
Vida regrada

Existem duas maneiras de se aprender: seguindo regras dadas por outras pessoas (inclusive as escritas nos livros) ou experimentando.

As regras ajudam muito os pais e professores. Através delas é possível ensinar que algumas coisas não são aceitas socialmente ou que são perigosas sem que uma experiência ruim ou que ofereça riscos precise ser vivida. Elas permitem, por exemplo, que não seja preciso que uma criança coloque a mão numa panela quente para aprender que pode se queimar.

Quando os pais dão regras ou conselhos aos filhos e eles são confirmados na experiência deles, os filhos tendem a seguir as outras regras que os pais lhes dão. Por exemplo, instruí meu filho a não comer demais. Um amigo dele comeu demais e passou mal. As coisas que aconteceram confirmaram o que eu disse a ele. Da próxima vez que eu lhe der algum conselho, ele provavelmente seguirá.

No entanto, se eu digo ao meu filho que ele não pode se afastar de casa quando estiver brincando na rua porque o bicho-papão pode passar e levá-lo embora, é muito pouco provável que a experiência dele venha a confirmar a regra que eu passei. Um dia ou outro, ele vai brincar mais longe de casa e verá que não passará nenhum bicho-papão para levá-lo (sem contar com a possibilidade de ridicularização por parte dos colegas, o que já seria uma punição social ou um indício de que a regra passada foi falsa). Nessa situação, é muito pouco provável que meu filho venha a seguir o próximo conselho que eu lhe der. E talvez ele possa começar a duvidar de coisas que eu diga de maneira geral (como “comer verduras faz bem”). Regras que são bem explicadas e que têm a ver com a realidade da criança têm grande probabilidade de serem seguidas. Regras passadas sem explicação e sem relação com a realidade são armadilhas que os pais fazem para eles mesmos.

As pessoas que sempre seguem regras ou que nunca as testam têm menos probabilidade de desenvolver o lado mais sensível ou experimental. É como a pessoa que vê, pelo vidro da janela que está nublado e se agasalha bem, porque aprendeu que em dias nublados faz frio e devemos nos agasalhar. Uma pessoa que experimenta mais, abriria a janela ou sairia para sentir o quanto está frio antes de se agasalhar.

É interessante que, sempre que possível, os pais incentivem esse tipo de aprendizagem através do contato com o mundo, pois é nesses contatos ou nas experiências reais, que acontece a verdadeira aprendizagem, mesmo quando ela começa com uma regra.

Luciana Rosa Machado
lu_rosa@bol.com.br.

Artigo publicado pelo Bragança Jornal Diário em 2004

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